Abstract

Homem de 69 anos de idade, hipertenso e fumador (100 Unidades Maço Ano), internado para estudo de quadro com 6 meses de evolução de dor abdominal pós-prandial, sem outros factores de agravamento ou de alívio, associada a anorexia, “medo de comer”, náuseas, enfartamento e diarreia fétida, sem muco ou sangue e acompanhada de deterioração do estado geral (perda ponderal 16% em 2 meses). Apesar de multiconsultado e de vários exames complementares, que incluíram estudo endoscópico alto e baixo e Tomografia Axial Computorizada abdomino-pélvica, permanecia sem diagnóstico. Pela suspeita de isquemia mesentérica crónica (IMC), realizou Angio-Tomografia-Computorizada (Figura 1 e 2), e posteriormente Angiografia, que demonstraram uma variante anatómica da artéria mesentérica superior proveniente do tronco celíaco, estenose osteal do tronco celíaco-mesentérico com compromisso hemodinâmico significativo e oclusão da artéria mesentérica inferior e respectiva circulação colateral exuberante.
A IMC é considerada uma entidade rara, constituindo menos de 5% da doença isquémica intestinal, sendo a doença aterosclerótica a causa mais comum.1 A maioria dos doentes apresenta-se com sintomatologia abdominal arrastada, com agravamento progressivo, sendo submetidos a um estudo extensivo sem diagnóstico definitivo.1 Este baseia-se numa história clínica detalhada apoiada com os meios auxiliares de diagnóstico que permitem o estudo das artérias gastrointestinais.1 A angiografia continua a ser o exame gold standard de avaliação das artérias gastrointestinais. As principais desvantagens são o facto de ser um método invasivo e não permitir a visualização dos tecidos adjacentes. Outros métodos não invasivos permitem, com excelente sensibilidade e especificidade, a avaliação de estenose das artérias gastrointestinais e circulação colateral, dos quais se destacam a AngioTC e a AngioRM, que ainda permitem a visualização dos tecidos circundantes1. Não existem estudos que comparem estes dois métodos entre si, mas análises mostram que a AngioRM sobrevaloriza 15% das estenoses (quando comparada com a angiografia), e parece haver vantagem AngioTC pela alta resolução e a rapidez de aquisição de imagens.1-2
O objectivo terapêutico principal é a revascularização da(s) artéria(s), o que pode ser conseguido por cirurgia de revascularização ou por angioplastia endovascular percutânea, com ou sem implantação de stent. Há quem defenda o tratamento cirúrgico como primeira linha para pacientes jovens e sem comorbilidades significativas, dado o maior risco de recorrência de sintomas no tratamento endovascular por re-estenose (28% vs 7-14%). A verdade é que a taxa de sucesso a longo prazo e as complicações são semelhantes e a opção terapêutica deve ser discutida caso a caso mediante o perfil clínico do doente em causa1.
No caso do nosso doente, atendendo ao seu perfil de risco cardiovascular e à história clínica detalhada, levantou-se a suspeita clínica que foi confirmada com os exames complementares adequados. Na ausência de comorbilidades significativas e dado a extensão das lesões optou-se por um tratamento cirúrgico, com realização de bypass aorto-mesentérico com colocação de prótese (Figura 3), que decorreu sem complicações, com alívio sintomático total e sem recorrência após um ano de follow-up.
Diagnóstico Final: Isquemia Mesentérica Crónica

1. Mensink PBF, Moons LMG, Kuipers EJ. Chronic gastrointestinal ischaemia: shifting paradigms. Gut 2011; 60:722-37.
2. Shih MC, Hagspiel KD. CTA and MRA in mesenteric ischaemia:part1, Role in diagnosis and differential diagnosis. AJR Am J Roentgenol 2007; 188:452-61.

© 2013 Galicia Clínica.

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